O que mais me doeu foram os meninos, os amigos. A dor tão genuína e tão forte, nitidamente consternando os que ficaram, transpassa pelos olhares perdidos.
Os olhares cheios de lágrimas, que se misturam ao suor do calor das 13h, ora são envergonhados, ora são acolhidos pela tristeza de perder um amigo. Todos na casa dos 20 anos. Inclusive Edson, o Dinho.
Poderia ser um deles. Poderia ter sido qualquer um deles. Mais um crime de racismo no Brasil. Zero movimentos sociais na porta do cemitério de Belford Roxo. No mínimo, cinco pastores confortam os presentes durante os dois enterros.
O cachorro de Dinho no colo de sua mãe, na beira do caixão, parece assimilar o peso do ambiente. Na capela A, Renata diz chorando que queria, pelo menos, poder ver o filho.
Enquanto a repórter da TV é inconveniente com os familiares, o caixão passa pela sombra da mangueira sendo carregado pelos amigos de Dinho.
Cinco jovens caminham com o corpo do amigo até a cova.
No caso de Jhordan, enterrado duas horas depois no mesmo cemitério, a cerca de 30 metros de Dinho, são oito amigos e parentes. Sete são jovens negros.
O pastor prega e o pai se ajoelha na beira do caixão do filho pedindo por justiça. Duas crianças observam da varanda da casa ao lado do cemitério. Duas crianças negras.
Os amigos de Jhordan, que tinha acabado de fazer 17 anos, assinam em uma bola de futebol que é deixada na cova em cima do caixão, junto com as flores.
Contorcida de dor, a mãe alisa o caixão como quem acaricia o filho pela última vez.
“Quanto mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?” - Marielle Franco
Fotos para Reuters. Belford Roxo, Rio de Janeiro. 14 Dezembro 2020.