A sensação era de estar em um seriado da Netflix, tipo Wild Wild Country ou Tiger King. Me vi dentro de uma dessas histórias absurdas que um dia serão roteirizadas e televisionadas pro mundo todo conhecer e se chocar.
A pauta de hoje foi acompanhar para o UOL o culto de aniversário da Flordelis, a pastora e deputada federal que é ré no caso do assassinato do próprio marido (que já foi filho de criação dela um dia).
Às 8h30, Elisa e eu chegamos no Ministério Cidade do Fogo, a igreja da pastora, em São Gonçalo, no Rio. Minha impressão era estar vivendo um surto coletivo.
Primeiro, um dos funcionários da Flordelis veio até nós dizendo que “quem hoje rói o osso, amanhã pode comer o filé” e pediu para sermos gentis na narração do evento. Concluiu dizendo que se não estávamos lá para ajudar, não deveríamos atrapalhar.
Em seguida, duas funcionárias muito gentis nos receberam e nos apresentaram a igreja. Um espaço enorme, com um palco grande e muitas cadeiras. Ao fundo, “Jesus” escrito na horizontal com uma palavra caindo de cada letra: Justo, Eterno, Salvador, Único, Senhor.
Na lojinha ao lado da igreja, DVDs com a imagem do pastor Anderson do Carmo na capa, o falecido marido de Flordelis, são vendidos ao lado de muitas Bíblias.
O culto estava marcado para às 9h. Flordelis chegou às 10h05 e foi para uma espécie de “camarim”. O culto já acontecia, para menos de 80 pessoas. Às 10h35, chegou um ônibus com 47 fiéis vindos de Itaboraí, município vizinho. Às 10h45, com a casa mais cheia, Flordelis entrou na igreja.
Cercada por muitas pessoas, entrou de máscara, passou álcool nas mãos, cumprimentou as funcionárias da entrada e sentou na primeira fila, na frente do palco que continha o letreiro escrito “parabéns”.
Os 47 fiéis de Itaboraí não conheciam a pastora. Eles nos disseram que nunca tinham estado naquela igreja. Foram à convite do pastor da igreja deles, que é amigo de Flordelis.
Às 10h50, foi a hora do pedido do dízimo. A logomarca do Itaú aparecia no telão enquanto funcionários da casa passavam pelas cadeiras com máquinas de cartão de crédito e débito. Gritando no microfone, um pastor incentivava os fiéis a “não terem soberba” e doarem mais.
O som altíssimo dentro da igreja dificultava conversar e até raciocinar. Os gritos chegavam a doer os ouvidos.
O evento contou com a participação de vários cantores e pastores amigos da deputada. Entre uma apresentação e outra, a pastora — que escondeu a tornozeleira eletrônica na canela, embaixo de uma longa saia preta — agradeceu a sua equipe de imprensa, seu assessor de Brasília e seu advogado.
Em outro momento, citou o nome da imprensa presente. É normal perguntarem nossos nomes e para onde trabalhamos em eventos como esse. Só não imaginei que meu nome e dos meus colegas fosse parar na boca da pastora, em cima do púlpito, em um momento de “benção”.
Ao final da apresentação, antes de servirem a ceia com estrogonofe, parte dos filhos de Flordelis subiu ao palco com outros parentes e amigos para cantar para a mãe: a parte que ficou ao lado da pastora depois do assassinato do pai. Houve uma ruptura entre os 55 filhos adotivos do casal, de um lado há os que confiam na mãe e do outro os quem não confiam.
Às 13h, o culto terminou com Flordelis aos prantos, descendo as escadas laterais do palco rodeada de uma entourage que dava a ela um ar de celebridade. Os parentes desceram atrás, mas ela continuava cercada por assessores que a levaram de volta para o camarim.